domingo, 17 de julho de 2011

HOMENAGEM A DILAR ROSA ALVES



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“E aqueles que por obras valorosas se vão da lei da morte libertando, cantando espalharei por toda a parte, se a tanto me ajudar o engenho e a arte”. (Luís Vaz de Camões)


Numa época de politiqueiros medíocres, de desassossego mundial, de conflitualidade latente, de privações continuadas, de desencanto global, importa levantar a cabeça, arregaçar as mangas, confiar nas nossas capacidades e na riqueza cultural das nossas gentes, a quem alguns agiotas imbecis nos consideram, como se fossemos “lixo”. Isso mesmo, “lixo”!

Como é possível, meu Deus!
A pátria de Camões, de Gil Vicente, João de Deus, de Fernando Pessoa ou de Saramago!?
A pátria de D.Afonso Henriques, de Nuno Álvares Pereira, de Afonso de Albuquerque, do Padre António Vieira, do Infante D. Henrique, de Vasco da Gama – Lixo!...
A pátria de Gago Coutinho e Sacadura Cabral, de Humberto Delgado – Lixo!...
A gloriosa pátria da Padeira de Aljubarrota, de Natália Correia, Florbela Espanca, Eunice Munhoz, Amália Rodrigues – Lixo!...
A pátria dos Arquitectos Sisa Vieira e Sotto Moura e do cão de água algarvio do Presidente Obama - Lixo!...
E os mais recentes ídolos mundiais no campo desportivo: Carlos Lopes, Rosa Mota, Nelson Évora, Joaquim Agostinho, Eusébio, Figo, Cristiano Ronaldo – Lixo!...
Ai é lixo!...
Confiemos amigos, que um dia a história se encarregará de os desmentir, essas tais agências de “rating”. Ao que nós chegámos, querida amiga e companheira Dilar!..

Nasce uma pessoa em 1928, para em 2011, precisamente 82 anos após, abrir a televisão, em qualquer canal e pumba!
Portugal é considerado pela Agência não sei quantos, lixo! Ok. - Mudemos de canal…

Chama-se Barros a sua terra natal, aquele sítio ali próximo à bela e histórica Grândola (Vila Morena – Terra da fraternidade, o povo é que mais ordena, dentro de ti, oh cidade…)
Ainda muito novinha, viu partir sua adorada mãe, redobrando energias para cuidar de seus irmãos, até que já moçoila, de uma beleza campestre que só o Alentejo sabe dar, se deixou encantar pelo seu único companheiro de vida conjugal, o Rogério Alves, que entretanto veio a encontrar alguma resistência familiar, para conseguir levar por diante os seus louváveis desejos de união. O amor e a persistência vencem sempre, quando os afectos e as emoções são reais e fundamentadas.

Casada e preparada para nova aventura, esta jovem de reconhecida beleza interior e exterior, dá à luz, aos 20 anos, precisamente no ano em que na distante Argentina, nasceu o autor destas linhas, o amigo fiel e dedicado desta Senhora, o meu “compadre” Vítor Alves, que cedo ocupou o lugar de cátedra daquele amor conjugal.
O menino Vítor, filho único e adorado de seu pai Rogério e de sua mãe Dilar, natural do Torrão (Alto Alentejo), foi assim como que um “torrãozinho” de açúcar para o casal, mais tarde Engenheiro Agrário em Évora e excelente forcado do Grupo da sua Escola Agrícola, companheiro de tantas andanças no mundo do Teatro, que nos uniu em Estoi, quando para aqui nos veio “roubar” uma das mais esbeltas raparigas da época, com quem aprendíamos os primeiros passos de dança, no velhinho e saudoso Centro Republicano ou no Clube Estoiense, a Ana Rosa, hoje sua mulher, de cujo enlace, veio a nascer a esbelta Patrícia, a polivalente Nucha e o prestável Rogério, em honra de seu avô paterno.

Está pois a nossa querida Dilar Rosa, no vértice desta construção, cujos ensinamentos tão bem soube transmitir aos seus e aos seus muitos discípulos e pupilos. Porém, a aventura amorosa e os afazeres e compromissos profissionais de seu marido, fiscal de construção de barragens, leva-os para Moçambique, mais precisamente para as proximidades da conhecida barragem do Limpopo, em Trigo de Morais, corria o ano de 1954. Aí montou a D. Dilar, um salão de cabeleireira, onde a arte capilar era oferecida prodigamente às suas clientes, ensinamentos que lhe deram ainda mais experiência para um futuro artístico que se adivinhava.
No teatro amador deu os seus conhecimentos e a excelência da sua enorme capacidade representativa, com uma passagem fugaz pelo cinema, encetou uma carreira de grande qualidade, reconhecida pela imprensa e critica local, encontrando noutro componente artístico que também possuía, o canto, a complementaridade necessária para ser muito justamente considerada uma autêntica “Artista”. Aleixo diria:
-Ser artista é ser alguém, que bonito é ser artista, ver as coisas mais além, do que alcança a nossa vista”.

Na pujança da vida, aos 29 anos de idade, concorre a nível da então província ultramarina de Moçambique, a um concurso de canções e fados, sendo muito justamente premiada com o titulo de ”Rainha da Rádio”, oferecendo ao Júri de selecção um “Fado Menor” de suprema qualidade, abrindo a boca de espanto ao Júri de selecção, na bela cidade da Beira. Quantos dos aqui presentes, não tiveram o privilégio e o condão de ainda escutar esta voz, em fados ou canções com que nos deliciava e encantava, com uma expressividade inata e própria dos verdadeiros artistas!...

“O Manel Ceguinho que era um ás do pedal, subescreveu-se na volta à Pretugal…”

Soube recentemente, numa conversa amiga que mantive com a nossa “Diva” - Dilar Rosa Alves, que nesse Concurso, eram cantadas 3 melodias, sendo que o estilo do “Fado Menor”, onde venceu, é assim como que o “Óscar” dos fadistas, o máximo dos estilos, podendo as letras variarem mas mantendo esse inconfundível estilo que, quem sabe, no final desta noite, alguns fadistas do “Fado Vadio” poderão oferecer-nos e dedicar à nossa querida Dilar.
Se isto é lixo!... Bandidos! Os tais Cow-boys do “rating”…

A perda prematura de seu amado esposo, em 1972, quase a deitou abaixo, pois com apenas 44 anos, o tremendo vazio foi-lhe penoso, mas a vontade indómita em prosseguir o seu fado, fê-la redobrar as forças e rodear-se de seu filho, nora e netinhos, quando a voragem incontrolável e imparável da Revolução de Abril, surgiu em 1974 na mãe pátria.
Quase que espoliada dos seus bens e pertences, ganhos honesta e duramente, regressou a Portugal para prosseguir o seu trajecto e projecto de vida, embora viúva.

Em Estoi veio habitar, conseguindo encontrar uma singela mas acolhedora casinha, ali no Sítio da Cancela, teria cerca de 50 anos de idade, ainda com muito para dar aos seus e àqueles que a partir daí, retiraram o proveito das suas enormes capacidades artísticas.

Na Casa do Povo mais antiga do Algarve, das 36 existentes, nada melhor do que abrir e escancarar as portas a esta Senhora, para alguns, com alguma incontida “dor de cotovelo” ou “ciumeira” a “viúva-alegre”, para outras, esse título, assentava-lhe mesmo bem, pois a sua competência, enquanto artista, iria revolucionar a juventude Estoiense, através das muitas peças que encenou, representou, dirigiu, das lições de dança clássica que promoveu, da beleza estética que soube implementar nos cenários, no guarda-roupa, na caracterização.
Um assombro, um aplauso!
Vá lá um mesmo agora, para não deixar tudo para o final!...Obrigado.

Os artistas, os “verdadeiros artistas”, como nós dizíamos um ao outro, vivem dos aplausos do público, são eles o oxigénio necessário para nos mantermos de pé, verticais, erectos!
E chamam-nos aqueles “bandidos” lixo, hein!... Cambada de agiotas!...

Quem não recorda, a representação sublime do “Mar” de Miguel Torga!? “Um pedido de casamento” de Anton Tchekov, “O gebo e a sombra” de Raul Brandão, ou …tantas outras peças…

Escreveu peças infantis e encenou-as com as nossas crianças. No teatro, era capaz de fazer todos os ofícios inerentes, como encenadora, directora de cena, aderecista, contra regra, cenógrafa, sonoplasta, luminotécnica, caracterizadora, ponto e, se necessário, limpava o salão e vendia rifas!...

E quem não recorda as esbeltas bailarinas, a dançar em pontas no palco da Casa do Povo de Estoi, com um guarda-roupa por si criado, qual Cristiane Dior, ou a nossa famosa estilista Fátima Lopes, bem como alguns cenários deslumbrantes, artesanalmente criados, porque as verbas nunca foram muitas para apoio às causas culturais da nossa aldeia.
E por isso, seus malandros, somos Lixo!?...

De fina sensibilidade e coração “amanteigado”, que ainda hoje lhe prega partidas, mas que nesta noite vai estar “reconfortadinho” e com um ritmar suave e doce, meiguinho até, aí por volta das 70, 75 pulsações por minuto, porque a homenagem que todos lhe queremos fazer é séria, é verdadeira, é justa, não é piegas, hipócrita, mentirosa, porque saída do coração dos amadores do Teatro, do Fado vadio, da Direcção e sócios da Casa do Povo e de Estoi, a aldeia que adoptou como a sua aldeia.
Vamos lá minha gente, mais umas palminhas à nossa Dilar Rosa Alves, sem pensar na “malandragem” da “Gatunagem do Rating”…

Directora de cena do Grupo de Teatro “Algarve” da Junta Central das Casas do Povo, levou a excelente peça “A raposa e as uvas” por essas terras além, com grande sucesso e aplauso.

Hoje e tenho que terminar, muito embora ainda tivesse tanto para dizer, mas os amadores do Grupo de Teatro “Amigos e Pupilos do Professor Amílcar” da Casa do Povo de Estoi, estão ansiosos por subir a cena e apresentarem, em estreia absoluta o “Auto do Ti Jaquim” de António Aleixo, que oferecemos em honra da D. Dilar Rosa Alves, ou melhor da nossa Dilar, aproveitando o tempo para agradecer à Direcção da Casa do Povo, à C.M.Faro e Junta de Freguesia de Estoi, a disponibilidade e o apoio possível, assim como aos nossos patrocinadores amigos e Estoienses, que facilitaram, sem hesitar, a pequena verba que servirá para os panfletos, os músicos e qualquer pequena ajuda que possamos oferecer com os trocos, a saber:

-BRITEFIL; GRÁFICA OSSÓNOBA; BAIÃO, LDA; CASA DE REPOUSO QUINTA DA BEMPOSTA; RÁDIO ESTOIENSE; MARIA DA CONCEIÇÂO MORAIS; CAFÉ – CASA DE PASTO “O VITOR”; SUPERMERCADO “O CANTINHO” (do neto do poeta Aleixo – Arménio Aleixo); SERRASONDA, LDA.; DUARTE GUERREIRO, LDA.; TALHO ANTÓNIO LOPES.

Se julgarem que estas Empresas são “lixo” não aplaudam…Muito obrigado.

Por fim querida amiga, uma palavra de estímulo, de ânimo, de coragem, àquela vida que só os verdadeiros “artistas” conseguem interiorizar e transmitir aos outros, às nossas raízes comuns, às nossas referências, aos nossos heróis e são tantos, tantos, neste solo pátrio, nesta ditosa pátria nossa amada, para continuar a “animar” as companheiras e companheiros da Casa de Repouso Quinta da Bemposta, onde reside, cantando ou rindo ao som do acordeão semanal, dando estímulo a este e àquele mais débil e de lagrimazinha ao canto do olho, vivendo, sorrindo e, bom…por vezes chorando em surdina, não por falta de carinho, mas de raiva, por haver ainda gente neste mundo, que pretende espezinhar um país que é o nosso, dos nossos pais e avós, que nada irá dever nos tempos que correm a esses mesquinhos que chamaram “lixo” à nobreza e ao carácter das nossas gentes.

O meu e nosso aplauso a si, querida Dilar, a quem iremos dedicar o trabalho que a seguir iremos apresentar neste palco, de tão gratas recordações, aos meus colegas, companheiros e amigos, nervosos, impacientes, a roer as unhas, onde, dos 11 actores, 6 pisam o palco pela primeira vez, a saber:
-Valério Pires; Duarte Guerreiro, Vasco Mascarenhas, Dores Pires, António Martinho e Isabel Pires. Um aplauso estimulante para eles – Obrigado!

Já agora os mais experientes, cito: Joaquim Aleixo, António Morais, António Pontes, Teresa Cardeira e Conceição Morais. Também merecem umas palminhas! Obrigado.

Não poderei esquecer a iniciada Lurdes Mascarenhas como ponto, o Rui Santos nos cenários, a Nucha, sua neta, na caracterização e o sonoplasta amigo José Joaquim Rodrigues. Vá lá mais umas palminhas para afastar os “piratas do rating”!...

Uma palavra para os técnicos das luzes e som, vindos especialmente da C.M.Faro para nos ajudar, Idelberto, Laurindo e colaborador, o agradecimento sentido à Casa do Povo, Junta de Freguesia e C.M.Faro, aos dois excelentes guitarristas convidados, Srs. Vítor do Carmo e José Santana e a todos os fadistas que na parte final para si e para todos os presentes nos deliciarão com os fados do seu vasto reportório.

Um quentinho e reconfortante aplauso vamos dar-lhes. Permitam-me destacar a excelente ajuda que a Mónica e a infatigável e sempre disponível Helena Cadete nos prestaram ao longo destes meses, bem como a preciosa compreensão da nossa Presidenta, Sandra Pires, que nos abriu os braços para nos acolher e finalmente ao público, que sempre aplaudiu a nossa homenageada, por ter dito presente nesta noite e que veio encher o salão para apoiar e aplaudir, uma vez mais a nossa Dilar, a quem desejamos votos de muitos mais anos de vida, porque, como diria o poeta:

-“Os dias mais felizes da vida, são aqueles que ainda não vivemos”.

Estoi, 16 de Julho de 2011
(Joaquim Aleixo)

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